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Como avançar na agenda de infraestrutura

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Publicado em 22/07/2021 14:32  -  Atualizado em  27/07/2021 16:35

Nesta entrevista à Carta da Indústria, O economista Claudio Frischtak, presidente da Consultoria Inter.B, destrincha os muitos fatores envolvidos no processo de modernização da infraestrutura brasileira. Membro do Conselho Empresarial de Infraestrutura da Firjan, ele diz que o país precisa aportar no setor 4% do PIB, durante 20 anos. Ou seja, temos um gap de R$ 200 bilhões anualmente. Mas como chegar nesse ideal? Com maior participação da iniciativa privada e avanços nas áreas regulatórias, nos marcos legais, na forma de financiamento, entre outros aspectos. Para o setor público, ele ressalta a governança como palavra de ordem. Ou seja, planejamento, com ranqueamento de prioridades, considerando a taxa social de retorno dos empreendimentos.

Carta da Indústria (CI): É possível tornar a infraestrutura a alavanca da retomada econômica?
Claudio Frischtak: Evidentemente que a infraestrutura por si só pode impulsionar, mas não acredito que seja o principal fator para o crescimento econômico. No médio e no longo prazo, o que determina o crescimento econômico, em grande medida, é a expansão da produtividade. O crescimento é composto de dois grandes componentes: o demográfico, especificamente da população em idade ativa (PIA); e a produtividade, que no Brasil é baixa e não avança. Logo, o crescimento potencial do país é igualmente baixo, da ordem de 1,5%. A produtividade, obviamente, é fruto de múltiplos fatores, mas em primeiro lugar da educação, em que investimos mal; é um problema até meio cultural. Em segundo lugar, continuamos com o país muito fechado, o que desestimula o crescimento, principalmente via inovação. Em terceiro, vem a infraestrutura.

CI: Qual a sua avaliação da história recente da questão da infraestrutura?
Claudio Frischtak: O primeiro aspecto é que há décadas investimos pouco. De 2001 a 2020, nossa média de investimento foi da ordem de 2% do PIB, incluindo aportes privados e públicos, de todos os entes nacionais e subnacionais. Isso fez com que nosso estoque de capital de infraestrutura seja hoje da ordem de 35,5% do PIB. Precisaríamos chegar a 60% e 65%, apenas para modernizar, ou seja, não seria ainda o limite máximo. Investimos hoje em torno de 1,6%, 1,7% do PIB, mas seria necessário algo em torno de 4% do PIB por duas décadas, ano após ano. O segundo aspecto é quanto à qualidade do investimento. Tivemos no passado recente, e ainda temos, muito desperdício. Quando o Estado tomou para si o dever de dirigir e de investir foi um desastre, porque a governança foi péssima. Houve mal planejamento e péssima execução.

CI: É possível chegar aos 4% de investimentos no setor?
Claudio Frischtak: Temos esse desafio, e isso nos dá um gap de cerca de R$ 200 bilhões anuais, mas não temos recursos públicos. Estamos no meio de uma crise fiscal há muitos anos. Além disso, os poucos recursos que temos, muitas vezes, são mal investidos. Só existe uma solução: mobilizar os recursos privados, sem os quais o país continuará manco de infraestrutura, sem conseguir realmente oferecer serviços decentes à população, seja de saneamento básico, energia elétrica, telecomunicações modernizadas – há países já com 5G –, transportes decentes, rodovias de boa qualidade, ferrovias que funcionem e que tenham uma participação significativa na matriz, da mesma forma, as hidrovias.

"Devemos fazer estruturação financeira para o projeto ser financiado pelo seu fluxo de caixa” - Claudio Frischtak

CI: Economistas costumam alertar que só a iniciativa privada não fará sozinha investimentos capazes de sustentar um crescimento maior do PIB. Qual a sua avaliação?
Claudio Frischtak: Uma coisa é dizer que é necessário, outra é dizer: é possível. São duas questões. A primeira é: há espaço fiscal para impulsionar o investimento público? Mesmo se houvesse, seria uma boa ideia? O espaço fiscal é limitado; cada real tem que ser muito bem alocado, até porque a prioridade deveria ser educação, saúde e segurança. Segunda questão: para ser bem direcionado, temos que transformar a governança. Continuamos apostando em investimentos de má qualidade. Fizemos isso no passado em grande escala e hoje, em escala bem menor.

CI: Como avaliar melhor as prioridades?
Claudio Frischtak: Temos que calcular a taxa social de retorno dos empreendimentos. Quando olhamos o Plano Nacional de Logística 2035, vemos que ele toma como dados uma série de projetos para os quais não foi calculada a taxa social de retorno. Sem isso, não se consegue fazer uma hierarquia, e com isso não há planejamento de fato. Há exemplos fantásticos, como a licitação da Cedae. Foi feito um trabalho brilhante do BNDES na modelagem, de dar credibilidade ao processo, com o apoio do governo do estado. E ainda com base no Marco Legal do Saneamento, aprovado recentemente. Então, temos solução.

CI: Depende de um conjunto de fatores?
Claudio Frischtak: Requer, primeiro, segurança jurídica; e, em segundo, previsibilidade regulatória. No caso do estado do Rio – mas também de outros, além do governo federal –, precisamos de melhor regulação, agências efetivamente independentes, com maior autonomia decisória, financeira e administrativa e de melhor qualidade. Em terceiro, precisamos continuar avançando com a agenda legislativa. O Congresso Nacional teve papel fundamental na aprovação do novo marco do saneamento, o que demonstra a importância do Legislativo. A quarta dimensão é uma modelagem correta, e nós vimos isso no caso da Cedae. Mais importante do que financiamento pelo BNDES é a credibilidade da modelagem. E temos uma quinta dimensão, que é a estruturação do financiamento.

CI: Nesse aspecto, você costuma defender o project finance, que quase não existe no Brasil. Por quê?
Claudio Frischtak: Quando se fala em R$ 200 bilhões em investimentos anuais, a pergunta é: há balanço/recursos para tudo isso? Precisamos atrair recursos domésticos e internacionais, mas devemos fazer uma estruturação financeira um pouco diferente, para o projeto ser financiado pelo seu próprio fluxo de caixa, que é o project finance. Nós não o usamos por uma série de circunstâncias. No exterior, o setor segurador é quem garante praticamente a totalidade do projeto, mas só se faz isso quando há garantia de que, se der errado, existe o chamado step-in rights, que quer dizer que ele terá a primazia sobre todos os credores e vai reestruturar o projeto. Por isso, as seguradoras no exterior possuem departamentos enormes de engenharia.

CI: Como deslanchar o project finance no Brasil?
Claudio Frischtak: Aqui o setor segura 5%, 10%, tão pouco que não está dentro do projeto de fato, porque o risco ainda é limitado. Quem assumia o risco no Brasil, até recentemente, era o setor público, ou seja, todos nós. Para o setor privado segurar, requer melhores projetos. Estamos há alguns anos discutindo a possiblidade de desenvolver uma plataforma de seguro, que envolva instituições internacionais, as seguradoras, o BNDES, mas não chegamos lá ainda. Temos alguns experimentos recentes, como de uma rodovia no Mato Grosso do Sul financiada praticamente sob a forma de project finance. Foi um processo envolvendo empresas menores, mas quer dizer que é possível.

CI: O Ministério da Infraestrutura calcula a contratação de investimentos privados de R$ 260 bilhões em 2021 e 2022, com leilões como o do Aeroporto Santos Dumont. Esses contratos têm potencial de contribuir para a retomada?
Claudio Frischtak: Sem dúvida. Ter carteira de investimentos de médio prazo é muito importante. O divisor de águas foi o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que é uma excelente inovação institucional. Começou no governo Michel Temer, foi mantido e deu horizonte para o setor privado que, além de previsibilidade regulatória, segurança jurídica e atualização legislativa, precisa de horizonte para se planejar. Segundo ponto: temos no país um programa de licitação de rodovias que é o maior do mundo, quando soma o federal com os estaduais. Temos ainda relevantes programas nas áreas portuária, aeroportuária e de saneamento básico.

CI: Algum ajuste a ser feito?
Claudio Frischtak: De modo geral, nessas concessões rodoviárias, por exemplo, tem-se acertado muito mais do que errado. É adequado o modelo de ter desconto máximo de 16%, 17%, e o restante ir para outorga. Importante para não repetir o que fizemos no passado: de um desconto tão excessivo nas tarifas de pedágio que um projeto se torna insustentável, e o vencedor da licitação depois quer devolver, que é a pior coisa que pode acontecer.

CI: Como os recursos da outorga da concessão da Cedae deveriam ser alocados?
Claudio Frischtak: Deveriam ser alocados em fundos de investimentos. Quando falamos em governança, o ponto de partida é planejamento, com ranqueamento dos projetos mais importantes; e para cada um deles, se o governo deve financiar 100%, fazer uma PPP ou arcar com o projeto executivo, cujo custo é de no máximo 5% do projeto. Eu alocaria em três fundos diferentes: um de desenvolvimento econômico, um de desenvolvimento social e outro de desenvolvimento territorial e ambiental, com um terço em cada um. E os retornos desses fundos iriam para essa fase de pré-investimento. Para garantir a integridade da gestão desses fundos, sugiro um convênio com o BNDES, que ajudaria nesse processo inicial e poderia fazer uma licitação aberta para gestores de excelência de todo o país, com critérios rigorosos. Então, enquanto fazemos adequadamente o processo de modernização regulatória, os planejamentos e calculamos a taxa social de retorno para os diferentes investimentos, esses recursos estariam aplicados corretamente.

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